sábado, 29 de dezembro de 2012

CURSOS DE FLAMENCO EM CANOAS

Quem quer aprender flamenco e mora em Canoas ou região pode aparecer a partir do dia 3 de janeiro na Escola La Tablada (Rua Silva Jardim, 47). Neste dia a partir das 19h, começaremos um curso de flamenco para quem quer dar os primeiros passos nesta arte. As inscrições podem ser feitas pelo e-mail: grazi_silveira@hotmail.com

A partir do dia 22, teremos um curso especial para quem já dança flamenco: curso de técnica de abanico (leque). Maiores informações sobre os dois cursos podem ser obtidas por e-mail ou no flyer abaixo.

Espero vocês!


sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

INTEIROS, INTENSOS E VERDADEIROS


Depois de assistir alguns espetáculos de dança neste fim de ano e de ver a premiação do Açorianos de Dança fiz algumas reflexões. Não se trata de uma crítica detalhada de cada espetáculo, mas conclusões que surgiram a partir do panorama geral das produções que pude acompanhar e dos processos nos quais estive envolvida de alguma forma seja como público, como intérprete ou como professora.

Tem muita coisa elogiável, mas também muita coisa a lamentar. Vou começar lamentando a falta de equipamentos nos teatros de Porto Alegre. É inadmissível que teatros caros, que cobram aluguel, não tenham cabos em perfeitas condições de uso ou que não abram suas portas para a crescente produção local. É triste, para dizer o mínimo, que os teatros municipais estejam sucateados, que não possuam monitores de retorno, microfones, equipamentos de iluminação, mesas de som e outros equipamentos técnicos necessários para que os artistas possam executar suas ideias da melhor forma possível. O que adianta o artista idealizar uma projeção no fundo do palco se o ciclorama está cheio de remendos e não fica esticado nunca? O que adianta o iluminador projetar uma luz “X” se ele só consegue executar uma “Y” por causa da falta de refletores ou canais na mesa? Isso sem falar em buracos no palco, cortinas que não funcionam e cupins que fazem parte do cenário porque não tem como evitar que eles entrem em cena.

Aliado a isto, surgem os problemas de formação e manutenção dos artistas. Conheço companhia de dança que figurou dois anos seguidos no Açorianos com espetáculos indicados na categoria Melhor Espetáculo que não tem lugar fixo para ensaiar. Estão sempre correndo atrás de salas para alugar. Os espaços disponíveis são sempre salas multiuso que ás vezes recebem exposições de artes plásticas que impedem ensaios ou salas públicas que privilegiam uma ou outra pessoa, pois estes fizeram investimentos no local como colocação de espelhos ou linóleos. Isto sem contar os locais mal administrados que fecham sem prévio aviso, salas com piso inadequado para a dança e outras coisas assim. Neste ponto, fico feliz em saber que existem grupos que possuem suas sedes próprias conquistadas com muito esforço e nas quais conseguem levar em frente seus trabalhos mesmo que tenham que dividir o espaço dos ensaios com aulas.

Aí surge outro ponto da minha reflexão de fim de ano, como é difícil ter que dividir o tempo entre ensaiar, produzir e dar aulas. Sempre achei que seria bailarina até não poder mais dançar e só depois começaria a dar aulas, mas a realidade não é esta. Quem quer viver de arte é obrigado a dar aula, a ter outro emprego, a fazer produção, fotografar, fazer roupas, criar cenários... Como não tem outro jeito, o importante é contar com a generosidade dos alunos e dos patrões e dividir o tempo de trabalho com temporadas, ensaios e viagens. Infelizmente, não sobra muito tempo para fazer aula o que resulta na falta de aprimoramento técnico que vemos em muitos artistas que estão na cena por aí. Os que dão aulas relacionadas às técnicas que estudam e trabalham podem utilizar-se das aulas dos alunos para alguns benefícios próprios, mas o que dizer daqueles que tem empregos em outras áreas? Lamento muito quando vejo boas propostas cênicas “amarradas” por falta de aprimoramento técnico e conhecimento dos artistas que estão no palco. Sei das dificuldades, também passo por elas. É frustrante ter uma ideia e não conseguir executá-la por falta de técnica corporal ou por limitações de movimento ou de pensamento. E não estou falando aqui de espetáculos de alunos. Cobro bom nível técnico de bailarinos profissionais. Sei, contudo, que muitas vezes não temos o tempo que gostaríamos e nem o dinheiro que gostaríamos para fazer todas as aulas que nos tornariam estes bailarinos dos quais estou falando. Bailarinos capazes de, utilizando-se da técnica e da emoção, emocionar, comunicar e propor reflexões.

Mesmo assim, creio que não se pode deixar de buscar o aprimoramento técnico. Qualidades técnicas e artísticas tem que estar em equilíbrio na cena. Para dar um exemplo do flamenco, é muito ruim ver um baile em que o bailarino erra o som ou o tempo musical de todos os “remates” (comentários sonoros feitos, em geral, com o sapateado) durante uma letra cantada pelo cantaor (cantor flamenco). Isto estraga a música do baile! Quem conhece flamenco sabe que música e baile estão intimamente ligados nesta manifestação artística e que a sonoridade de tudo que se faz com pés e corpo interfere no resultado musical da cena. Quando a música da cena não é bem executada, o trabalho perde a magia. A falta de técnica dos artistas, sejam eles cantores, músicos, bailarinos ou atores, acaba atrapalhando a qualidade artística da cena e arruinando o resultado final do trabalho. Penso tanto nisto tudo que chego a ficar meio revoltada com as condições de trabalho que os artistas encontram por aí. A maioria de nós consegue levar à cena trabalhos interessantes graças ao investimento próprio de energia, dinheiro e tempo. É um trabalho do qual gostamos, mas que poderia ser facilitado se tivéssemos locais para ensaiar, tempo e dinheiro para fazer aulas, salas bem equipadas onde apresentar nossas produções e temporadas maiores que possibilitassem mais espaço na mídia e na agenda do público.

Falei da necessidade que sinto de ver artistas bons tecnicamente, mas falta ressaltar a importância de intérpretes que sejam interessantes em cena. Do que adianta ver artistas com excelente técnica se eles não comunicam nada, se mais parecem um picolé de chuchu ambulante? Não dá para subir num palco somente baseado na limpeza dos movimentos, na clareza dos sons que tiramos dos instrumentos, na elasticidade acima da média, na voz limpa e clara com um alcance formidável... Enfim, boa técnica é fundamental, diria que é básico, mas o artista tem que ser mais do que isso. É tão mais interessante quando vemos pessoas em cena que transmitem alguma coisa. Não que o público precise entender tudo o que estar acontecendo no palco, mas acho que é fundamental tocar de alguma forma aqueles que estão na plateia. Emocionar, chocar, fazer pensar, tirar do lugar comum, incomodar, surpreender... o artista precisa querer mais do que simplesmente executar passos, notas e marcações cênicas sem falhas técnicas.

Pensando nisto, me deparo com pessoas cenicamente egoístas que afirmam pensar somente em si mesmos enquanto dançam, tocam, cantam, iluminam. Não consigo chamar de artistas pessoas que não respeitam os colegas de cena, que não interagem ou se comunicam com o público ou ainda que tem a certeza da verdade absoluta. Sobre a troca com o público, não estou defendendo aqui o mercantilismo artístico. Acho igualmente desinteressantes trabalhos que lidam com o “fácil”, com o “digerível” que dão ao público aquilo que este está acostumado a ver. Isto pode ser um ponto de partida para conquistar plateias que ainda não estão acostumadas à arte, mas o artista não pode ficar limitado ao lugar comum. Creio que na gênese de cada artista está a transgressão. Os artistas são como as crianças quando fazem “arte”, transgridem os limites impostos pelo meio. Aliás, o artista é, a meu ver, aquele ser incansável que também busca sempre transgredir seus próprios limites tanto corporais como de pensamento. Como criar ou nos inspirar se não prestarmos atenção ao que nos cerca e aos outros seres que nos rodeiam e contaminam, que nos mostram novos caminhos, novas formas de pensar, de agir, de ver o mundo? Ou ainda como ser artista se pensarmos somente em ganhar dinheiro ou aparecer no jornal?  Ter o reconhecimento artístico e financeiro digno pelo trabalho realizado é justo, mas trabalhar com arte apenas para ganhar dinheiro é lamentável e até um pouco estúpido.

Enfim, defendo que os artistas sejam inteiros no seu fazer artístico, tão inteiros quanto puderem ser dadas as condições de trabalho e formação que tem a seu dispor. O que importa é não se acomodar, buscar sempre mais, melhorar sempre, modificar-se sempre, transgredir continuamente os próprios limites. Meu desejo para o futuro é que nós, artistas, sejamos inteiros, intensos e verdadeiros para que estes qualificativos estejam presentes também em nossas propostas levadas a cena, nosso fazer artístico, nossas criações e inspirações.